PICHAÇÃO: arte ou subversão? algumas reflexões pessoais

Sábado, dia 29 de julho de 2017, na Livraria do Luiz, Galeria Augusto dos Anjos, Centro Histórico de João Pessoa, houve um debate intitulado "PICHAÇÃO: arte ou subversão?". O tema é complexo, fato. O grafite, na ocasião, foi contemplado enquanto arte. Técnica específica com forma, característica, estudo, estrutura, essência, poesia e um(a) "artista". De acordo com o Antropólogo Carlos Azevedo, presente na mesa: "O grafite nos provoca emoção, nos aciona os sentimentos, nos envolve em emotividade". O grafite denuncia e paralisa. Ele nos estaciona, nos questiona. O grafite ultrapassa o limite da expressão e se configura enquanto arte. No entanto, o grafite é arte quando é legal, quando é permitido. Grafite, por mais belo, pela mais perfeita técnica que apresente, em muros de escolas, fachadas de casas, instituições públicas ou privadas, Igrejas ou Templos variados, Monumentos, entre outros, sem permissão do proprietário/órgão, é ilegal, e consequentemente, é crime*. 

No entanto, o "pixo", em si, foi a grande discussão do debate. Arte ou subversão? Eis a provocação inicial. Mas, o que é arte? O que define ou conceitua "arte"? Pichação é arte? A mesa se dividiu, o público se dividiu, mas o debate seguiu um mesmo rumo. 

Na ocasião, foi exibido um documentário intitulado "Pixo", que retrata a origem da pichação enquanto fenômeno social em São Paulo no ano de 2008. O documentário deixa claro que "pixo" é a arte da periferia. O Antropólogo, e também Grafiteiro, Thayroni Arruda, presente na mesa, não concorda, conduzindo o público a reflexão de quem está por trás do "pixo". O contexto de vida e o espaço social do pichador. Se o "pixo" é a luta pela cidade, é o debate entre o problema estético x a propriedade privada; se é a juventude marginalizada que deseja garantir seu espaço; quem é este sujeito, quem é o "pichador"? 

De acordo com estes questionamentos, surge uma voz delicada em meio aos ouvintes: "Vocês precisam dialogar com os pichadores, conhecer os espaços, participar das ações, viver o cotidiano deles. Vocês precisam "ir" até eles". O que esta colocação provocou em minha mente foi: Quem? Onde? Quando? Ficou claro que a pichação é uma forma de expressão da juventude inquieta. Inicialmente, a juventude pobre e marginalizada, a juventude de periferia, a juventude sem oportunidades (tal como o pichador que picha e não sabe ler, fato impressionante do documentário), a juventude que denuncia, que exige do sistema "providências", que luta pelo seu espaço, por seus valores. No entanto, esta "juventude", tal como mencionado no momento, não é formada apenas por grupos de jovens "marginalizados" (usando a palavra para designar à margem da sociedade), de periferia ou pobres. Mas, também, por sujeitos da classe média e alta. Quão complexo se tornou o debate para minhas reflexões. Agora entender este sujeito e suas motivações tomou outros rumos: pessoal e coletivo. Para além dos jovens da periferia, privados de inúmeros direitos, o que o jovem classe média alta está reivindicando? Que espaço ele quer conquistar? Qual sua subversão? Que sistema é este que ele denúncia? Que espaço é este que ele reivindica? Qual a sua causa? Existe uma causa de representatividade coletiva?

A pichação, a meu ver, é um fenômeno social, sem dúvida. Um fenômeno que precisa ser compreendido na ótica de um contexto espacial e temporal. Se pensarmos em técnica, estudo e característica específica, a pichação possui. Durante muito tempo, ao meu ver, enquanto cidadã, se tratava de um ato de expressão e subversão contemplado em cada momento da história. Uma forma de registro de um processo histórico. E ainda consigo enxergar desta forma. Ainda consigo ver a denúncia social, histórica e política em "pixos" da minha cidade. E sempre acreditei, que tal como um processo, diante de um momento de mutação e crise, a subversão se fez/faz presente de alguma forma. 


Fotografia do Acervo pessoal da autora. João Pessoa, 2017

Quem é o pichador atrás da tag? Qual sua motivação, qual sua necessidade de expressão? Estas são as inquietações de "sentido" que ficaram em minha mente. Uma parte considerável destes pichadores transitam por todos os espaços, tal como afirma uma outra colocação foi feita no debate advinda do público presente, que diz o seguinte: "Na Carta do Lyceu Paraibano, está destacado um grafiteiro reconhecido que é um dos grandes pichadores da cidade". Daí me veio a outra inquietação, "qual grafiteiro está isento do passado (e presente pichador)?" Esta dualidade em um mesmo elemento chama minha atenção, também. A manutenção das duas vertentes em uma só pessoa aponta para uma necessidade de denuncia, e ao mesmo tempo, reconhecimento artístico na sociedade. O mesmo elemento que dialoga/serve/representa a elite artística e intelectualizada, que se faz elite, reconhecido e renomado "artista" nos espaços, se expressa na sua vertente de pichador, no anonimato público e no reconhecimento das tribos urbanas. Interessante a dualidade do ser humano enquanto sujeito de expressão. Ele é múltiplo, fato. Ele causa, provoca, denuncia e divulga. Ele é parte do que faz e do que critica. Ele se "transforma" pela arte e se "perde" pela ação. Quem é ele e o que ele quer dizer? Eis o silêncio que ficou nas minhas inquiestações.


*Lei n.º 12.408/2011, Art. 65, § 2o Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente e a observância das posturas municipais e das normas editadas pelos órgãos governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio histórico e artístico nacional.”

Quando eu pensei que você fosse som, descobri que é poesia

O som, a voz, o ser. O jeito, a delicadeza, a inquietação, a possibilidade. O nada, a incerteza, o abismo. A aventura, o risco. Tudo iss...